Golpe do app gay: polícia prende suspeito de atrair jovens para emboscada e assaltá-los no Sacomã, na Zona Sul de SP

Homem já foi reconhecido por cinco vítimas como o autor dos crimes. Segundo a Secretaria de Segurança Pública, as investigações seguem em andamento por meio de um inquérito policial instaurado pelo 95° Distrito Policial.

A Polícia Civil prendeu um dos suspeitos de assaltar jovens na região do Sacomã, na Zona Sul de São Paulo. As vítimas são atraídas para uma emboscada após marcar encontro por meio de aplicativos de relacionamento voltado para o público gay.

Um levantamento do g1 apontou que ao menos 9 roubos e tentativas foram registrados nessa região (leia mais abaixo). A área é a mesma onde Leonardo Rodrigues Nunes, de 24 anos, foi assassinado, em 12 de junho.

O mandado de prisão temporária foi cumprido na última quinta-feira (20) na região de Heliópolis, próximo aos endereços dos roubos. O suspeito foi detido na residência da mãe, onde foram apreendidos dois capacetes de moto.

Segundo uma fonte do 95° Distrito Policial (DP), responsável pela investigação, o criminoso já foi identificado como o autor dos assaltos por cinco de sete vítimas convocadas pela polícia. O reconhecimento foi possível em razão das características do rosto e da tatuagem.

Durante interrogatório na delegacia, o homem negou ter cometido o crime e se recusou a passar outras informações. Para a investigação, a onda de assaltos foi promovida por mais de dois criminosos que provavelmente se revezam durante as ações.

Como os endereços das emboscadas são próximos e muitos não possuem câmeras de segurança, a Polícia Civil também acredita que os criminosos conhecem bem a região.

Em nota, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) informou que “as investigações seguem em andamento por meio de um inquérito policial instaurado pela unidade para a identificação dos demais envolvidos e o total esclarecimento dos casos”.

Os roubos do levantamento do g1 foram registrados nos últimos cinco meses, sendo um em fevereiro, quatro em março, um em abril, e um em maio. Duas vítimas também sofreram tentativas de assalto em março e maio.

Confira o modus operandi dos criminosos a partir dos relatos obtidos pela reportagem:

As vítimas conhecem o suposto rapaz pelo Hornet ou Grindr, aplicativos voltados para o público gay;
Após conversarem por dias pelo aplicativo de relacionamento, o suspeito compartilha seu número de WhatsApp, dando sequência a conversa e ganhando a confiança do jovem;
Um encontro é marcado na região do Sacomã, onde supostamente o suspeito mora;
O criminoso se oferece para pagar a corrida do carro de aplicativo até o local do encontro e acompanha a localização da vítima em tempo real;
Quando o jovem recusa a oferta e paga pela própria corrida, o suspeito pede a localização em tempo real pelo WhatsApp ou pede os dados da corrida;
Chegando ao local, a vítima encontra a rua deserta;
Então, o jovem é abordado por dois homens armados em uma moto que anunciam o assalto;
O principal objetivo é roubar o celular das vítimas, porém os criminosos também já levaram cartões, carregador, fones de ouvido e até mesmo par de chinelos;
Mediante ameaças de morte, eles ainda obrigam a vítima a passar a senha do celular e, posteriormente, efetuam compras em aplicativos como de delivery de comida.

‘Vi ele atirando na minha direção’
Morador de Santo André, João*, de 24 anos, escapou por pouco de um assalto no mesmo endereço em que Leonardo Rodrigues Nunes foi assassinado, próximo ao Sacomã. O episódio ocorreu em 15 de maio.

Durante semanas, João conversou com um rapaz com quem deu um match no Hornet. Depois, eles migraram para o WhatsApp. “Ele se mostrou uma pessoa muito humana, mandando agenda, comentando o que ia fazer, mandava foto dele. Não me deu brecha para desconfiança”.

No dia do crime, a vítima estava na faculdade na Zona Oeste de São Paulo, quando foi convidada para ir à casa do rapaz. O criminoso pediu para ele compartilhar a localização em tempo real do Uber.

Chegando no local combinado, João não encontrou ninguém. Enquanto tentava localizar o endereço correto, dois homens em uma moto se aproximaram e o abordaram. A vítima achou que os criminosos carregavam uma arma de brinquedo, por isso reagiu ao assalto.

“Ele subiu na moto e falou: ‘vou te matar e pegar tudo’. Na hora que ele atirou, não sei o que aconteceu, acho que foi meu anjo da guarda, eu caí no chão um pouco antes dele atirar. Eu vi ele atirando na minha direção. São cenas e sons que não vão sair da minha cabeça.”
Então, uma moradora apareceu e começou a gritar, por isso os assaltantes fugiram sem levar nada. A mulher acolheu João em sua casa e compartilhou que outros casos similares ao dele vem acontecendo na região.

‘Me deram um soco na testa e bateram com a arma na minha barriga’
Em março, Flávio* conheceu um rapaz pelo Hornet e, após dias de conversa pelo aplicativo de relacionamento e pelo WhatsApp, decidiram marcar um date.

O suspeito se ofereceu para pagar o Uber, porém Flávio preferiu pagar pela própria corrida. “Quando eu entrei no carro, ele pediu para tirar um print do Uber para ele acompanhar a viagem. Eu mandei, e ele pediu para eu avisá-lo quando faltasse cinco minutos para chegar, para ele descer e me encontrar no portão da casa dele”.

Chegando ao destino, ninguém espera por Flávio. Foi quando dois homens em uma moto apareceram. Um deles sacou a arma e pediu para a vítima entregar tudo.

“Eu dei o meu celular. Eles ainda pegaram meu chinelo, carregador e fone. Queriam que eu desbloqueasse o meu celular e pediram a senha de tudo o que eu tinha. Eu fiquei tão nervoso no momento que eu não lembrava a senha. O celular ficou bloqueado [após muitas tentativas].”

“Durante dez minutos, eles ficaram falando que iam me matar. Engatilharam a arma, me deram um soco na testa e bateram com a arma na minha barriga. Por fim, se convenceram a levar o celular bloqueado mesmo. Me deixaram na rua e saí correndo para pedir ajuda.”

Após alguns minutos, uma viatura da Polícia Militar apareceu no endereço, porque alguns vizinhos ouviram o assalto e ligaram para a corporação. A vítima foi levada para o 26° Distrito Policial do Sacomã, onde o boletim de ocorrência foi registrado.

O g1 não conseguiu contato com a Hornet para comentar os episódios. Pelo site da plataforma, a empresa inclui dicas de segurança para os usuários e um email pelo qual os usuários podem denunciar casos. No entanto, não possui informações sobre verificação de perfis na plataforma.

Procurado para saber se o aplicativo citado e o Grindr estão sendo investigados, o Ministério Público de São Paulo(MP-SP) informou que “vai verificar junto as autoridades policiais se os aplicativos estão obstruindo informações para o deslinde dos casos. Após, deliberamos sobre a atuação do GAESP, se é caso ou não de instauração de inquérito”.

By Stella Franceschini

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