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Idosa procurou atendimento médico por diversas vezes antes de ter perna amputada — Foto: Arquivo Pessoal/Neusa Rodrigues
Idosa procurou atendimento médico por diversas vezes antes de ter perna amputada — Foto: Arquivo Pessoal/Neusa Rodrigues
Uma idosa de 60 anos conseguiu na Justiça o direito de receber uma indenização da Prefeitura de Peruíbe, no litoral de São Paulo, após ter uma perna amputada na altura do joelho devido a falhas no atendimento médico do município. Ela receberá R$ 35 mil, mas não comemora a decisão.
Em entrevista ao G1 nesta terça-feira (15), Neusa Rodrigues da Silva Costa contou que, em 2015, procurou por diversas vezes o Ambulatório Médico de Especialidades (AME) de Peruíbe com formigamentos na perna esquerda, mas que não recebeu indicação de medicamentos ou quaisquer outros tratamentos.
“Eu sentia dores nas pernas, mas os médicos não passavam remédio para circulação. Sentia muito formigamento. Depois, apareceram feridas, voltei lá e também não tive orientação”, relata. Além dos problemas na perna, a idosa é diabética e não foi encaminhada a um especialista na cidade onde mora.
Ao longo de alguns meses, a situação se agravou, ao ponto de ela precisar ser internada. Mas, de acordo com o advogado da vítima, Helio Marcos Pereira Junior, a negligência continuou. “Ela só teve atendimento médico adequado em Itariri, no Vale do Ribeira”, conta. De lá, a idosa foi encaminhada para uma unidade de saúde referencial em Pariquera-Açu. “Infelizmente, já era tarde. Foi lá onde ela teve seu membro amputado”, conta o advogado.

Perna de idosa foi amputada meses após primeira procura por atendimento médico em Peruíbe, SP — Foto: Arquivo Pessoal/Neusa Rodrigues
Perna de idosa foi amputada meses após primeira procura por atendimento médico em Peruíbe, SP — Foto: Arquivo Pessoal/Neusa Rodrigues
A idosa lembra que, antes da amputação, trabalhava fazendo marmitas para vender. Após os problemas de saúde e a cirurgia, ela teve que parar de trabalhar. “Estava acostumada a me virar, ficar sabendo que ia ter que tirar a perna foi ruim demais”, diz. “Depois disso, fiquei sem fazer nada, não tinha condições. Sem a perna, não dá”.
Ela conta que, dois anos após a amputação, conseguiu uma prótese para a perna. No entanto, a idosa diz que não consegue ficar muito tempo em pé e, por isso, depende de ajuda. “Conto com muita ajuda dos meus parentes”.

Idosa afirma que, mesmo com prótese, não consegue ficar muito tempo em pé e precisou deixar de trabalhar — Foto: Arquivo Pessoal/Neusa Rodrigues
Idosa afirma que, mesmo com prótese, não consegue ficar muito tempo em pé e precisou deixar de trabalhar — Foto: Arquivo Pessoal/Neusa Rodrigues
Indenização
A decisão unânime, favorável à idosa, ocorreu na 2ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo. O julgamento contou com a participação dos desembargadores Claudio Augusto Pedrassi e Carlos Von Adamek. O município de Peruíbe foi condenado a indenizá-la em R$ 35 mil por danos morais, devido às falhas no atendimento médico.
A desembargadora Luciana Almeida Prado Bresciani, relatora da apelação, afirma que o laudo pericial constatou a falha no atendimento médico. “Tivesse sido realizado o pronto-atendimento e intervenção, a amputação poderia ter sido em menor extensão”, relatou. “Os elementos dos autos são convincentes acerca da pouca atenção dada ao quadro da paciente, restando bem comprovado o nexo causal, consistente na ausência de atendimento adequado, com urgente encaminhamento a médico especialista”.
A idosa, ao saber da decisão, afirmou que não há o que comemorar. “Minha maior comemoração seria ter minhas pernas boas”. O advogado concordou com Neusa. “Comemoraria se tivesse uma prestação de serviço público de qualidade”, afirma. “Infelizmente, é uma comemoração de parcial justiça, para que essa decisão sirva de referência e que o município melhore o atendimento público prestado aos moradores”.
Em nota, a Prefeitura de Peruíbe afirma que o caso é de 2015, e que, de acordo com a própria sentença do juiz Anderson José Borges da Mota, houve “certo nível de negligência da parte autora com sua própria saúde”, e que a administração municipal “não se recusou a prestar o devido atendimento”. Ainda conforme abordagem do magistrado, o município solicitou junto à Central de Regulação de Ofertas e Serviços de Saúde (Cross) vaga para avaliação de especialista em cirurgia vascular.
Segundo a sentença, quando um município não possui médico especialista em cirurgia vascular, dependendo da Cross para verificação de vaga, não pode ele adotar o procedimento cirúrgico necessário à preservação da saúde da paciente.
A administração municipal destaca que o sistema Cross é regional e Peruíbe está incluso entre os municípios do DRS (Departamento Regional de Saúde) de Santos. O processo considera a localidade do paciente conforme endereço informado. Entretanto, a paciente procurou posteriormente município do Vale do Ribeira, que prioriza vagas em cidades do DRS de Registro, onde há população inferior à da Baixada Santista e, portanto, teve mais facilidade em encontrar vaga devido a tradicionalmente a região ter uma demanda menor de atendimentos.
A prefeitura também afirma que a decisão foi reformada pelo Tribunal, mas com reconhecimento que a autora contribuiu para o ocorrido, não atendendo às recomendações médicas, e que a decisão do Tribunal ainda não transitou em julgado.